Charqueadas fica a 65 km de Porto Alegre, e tem como praticamente único evento tradicional o “Rodeio”, que acontece anualmente. Em termos de bandas, não há (e provavelmente nem houve) uma “cena”, apesar do número proporcionalmente grande de pessoas envolvidas com música, para uma cidade pequena. Nesse sentido, uma de suas manifestações musicais adolescentes mais interessantes, e também obscuras, foram as bandas e projetos por onde passou Edson Rafael, o “Kabeça”, que sempre manteve uma linha que jamais abandonou o underground, em termos estéticos, sonoros e de difusão. Uma coisa interessante de se observar na carreira de qualquer artista, independente de seu seguimento, são as mudanças e evoluções que normalmente ele visa alcançar e, assim sendo, o quão intacto ele consegue manter suas características básicas, conservando a essência. Envolvido desde o início da década de 90 em atividades musicais, Kabeça explorava basicamente sonoridades que seriam categorizadas comumente como “indie”, “alternativo”, e adjacências... Mais propriamente, a antiga (perdida?) arte de fazer barulho inconsequente, fazendo da falta de maiores conhecimentos teóricos não um beco sem saída, mas sim uma qualidade, uma ferramenta a favor das idéias. Pois bem, o tempo passou, muita coisa mudou e, agora, o Elephant Pain, banda onde atualmente ele sucede suas idéias, com a ajuda de Gustavo Barreto e outros amigos, em eventuais contribuições, já contabiliza bastante trabalho totalmente auto produzidos, executados e gravados.
O que se observa ao longo desses é, realmente, uma evolução no trabalho dos músicos envolvidos, o barulho continua lá, a despretenção, o teor frequentemente entediado dos vocais, mas as melodias ganharam espaço, lapidação, contorno. Violões e teclados fazem conjunção com melodias muitas vezes suaves, sobre uma cozinha simplíssima, provida por baixo e bateria eletrônica, em execuções que não esbanjam técnica ou preciosismo, mas ganham em naturalidade, sem exageiros ou pretensões fora de lugar, mesmo com algum experimentalismo, que não deixa as canções restritas a um lugar comum. A aspereza se faz presente com guitarras que aparecem, às vezes, enfatizando certas passagens e refrões. Mas não espere uma grande repetição de elementos, as canções mantêm um clima blasé, tipo “sonolento”, mas quase sempre com um ou outro detalhe particular, favorescendo o todo.
Enfim, o Elephant Pain apresenta a música mais completa e equilibrada já perpretada por esses músicos, que são figuras de longa data nos subterrâneos de uma pequena cidade incógnita, num trabalho que terá seus atrativos tanto para quem já acompanha, como para quem se faz uma novidade.
*Release escrito por Jaime Dalandray.
Nenhum comentário:
Postar um comentário